quarta-feira, 14 de julho de 2010

Dissecando o Falso Bicentenário de Porto Alegre - I

A Questão das Datas

Para uma melhor análise sobre o momento da criação de Porto Alegre devemos fazer um contraponto de como era constituída toda a noção de História tanto na cidade quanto no Rio Grande do Sul. Até a década de 20 a literatura sobre fatos históricos era produzida por intelectuais provindos da área do Direito, Engenharia, Jornalismo e Medicina (MONTEIRO, 2002, p.15).

É deste período que surge a primeira teoria sobre o aniversário da capital com a publicação da obra intitulada “A Fundação de Porto Alegre” em 1906 pelo jornalista Augusto Porto Alegre. Neste trabalho foi feita uma pesquisa com bases “a partir de pesquisa limitada em documentos, relatos de viajantes e crônicas” (MONTEIRO, 2002, p.16). Em uma análise que começa com a chegada dos casais açorianos a cidade em 1742 até a transferência do título da capital de Viamão para Porto Alegre em 24 de julho de 1773 por José Marcelino de Figueiredo.

Augusto Porto Alegre acabou criando o chamado “mito açoriano” (MONTEIRO, 2002, p.16) para a cidade. O texto foi durante anos a única referência sobre esta faceta histórica da capital. Com o passar da década de 20, Porto Alegre teve uma aceleração de crescimento urbano. Em consequência havia toda uma reformulação urbanística para conceber a evolução natural de toda uma população, fato apontado pelo cronista Antônio Álvares Pereira em 1883 com o livro Antigalhas. Com isso tornou-se necessária a presença de uma especialização no estudo e preservação da história da cidade. Em consequência a essa idéia, nas décadas de 20 e 40 surgem marcos importantes para a profissionalização do historiador no Estado:

 

A “história”, como “disciplina”, começou a tornar-se um campo de saber autônomo no Rio Grande do Sul com a criação do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul IHGRS – 1920 – e dos cursos superiores de História e Geografia – 1940. Processo este que se estenderia até a década de 1970, com a criação dos Programas de Pós-Graduação em História. (MONTEIRO, 2002, p.14).

 

Com a criação do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul (IHGRS) houve uma especialização em toda a publicação sobre História, gerando uma maior confiabilidade de informações tanto para a elite cultural do Estado quanto para o público em geral. Esta instituição será decisiva na escolha do aniversário como sendo em 1740 e voltando atrás em sua decisão com o passar dos anos.

Em 1937 José Loureiro da Silva assume o chamado “governo municipal” de Porto Alegre. Ele acaba engajando-se nessa busca histórica sobre o município e integra em sua equipe como bibliotecário o intelectual Walter Spalding, membro do IHGRS. A partir desta parceria começam a ser publicados diversos artigos no chamado Boletim Municipal criado em 1939.

Todavia ainda não existia um consenso sobre a data comemorativa de fundação da cidade. Mesmo com o Instituto funcionando desde 1920 ainda havia dúvidas sobre a data de aniversário proposta originalmente por Augusto Porto Alegre. O ano de 1742, indicado como primeira referência de ocupação territorial, chamava a atenção de Loureiro da Silva, afinal, um possível bicentenário poderia aproximar-se. Entretanto a data oficial continuava a de 1773, para sanar essa dificuldade o prefeito manda um ofício diretamente ao IHGRS em 20 de outubro de 1939 onde:

 

(...) deixa claro a vontade da administração municipal de esclarecer as controvérsias para poder “assinalar com festivas comemorações a passagem do 2° Centenário da cidade”. Constata-se que essa demanda de “história” estava associada a uma solicitação política e uma vontade “comemorativa” da administração local. (MONTEIRO, 2002, p. 18).

 

O Instituto prontamente inicia uma grande pesquisa em documentos. Neste estudo entra a figura do estancieiro Jerônimo de Ornellas e Vasconcellos, que estaria estabelecido nas terras onde se localiza Porto Alegre já em 1732. Segundo as pesquisas do IHGRS, ele recebe a oficialização de suas terras para criação de gado em 5 de novembro de 1740. De posse dessas informações a entidade emite um ofício para o prefeito no dia 23 de novembro de 1939 com as novas descobertas. Com este documento Loureiro tem o poder de oficializar o novo marco comemorativo.

A nova data de aniversário de Porto Alegre é permeada por uma polêmica, já que acaba servindo como manobra política para o atual prefeito e pelo fato de Walter Spalding assinar o documento final do IHGRS. Loureiro da Silva executava grandes obras na cidade e acaba conseguindo “encaixar” elas na mesma época das comemorações do bicentenário.

Lista geral de referências.

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